Print Coluna 29-10 - Conectividade a cultura do acesso e do compartilhamento

Conectividade: a cultura do acesso e do compartilhamento

Tema: Conectividade: a cultura do acesso e do compartilhamento

Veículo: Diário da Manhã

Número: 11.335

Página: 19

Caderno: Opinião Pública

Data: 29/10/2018

A passagem de uma cultura de posse e guarda para uma cultura de acesso e compartilhamento é fato, embora também seja fato que mudanças culturais não ocorram em breve espaço de tempo. A perspectiva de mudança já era notada na caracterização das gerações Baby Boomers, X, Y e Z, em serviços como Uber e AirBnb, em comportamentos socioculturais com o uso de tecnologias baseadas em mídias sociais e na produção de conhecimento, com uma tendência para publicações científicas em plataformas gratuitas, chamadas open access.

Ainda no campo da produção científica e cultural, os ícones da cultura de posse e guarda se deixaram seduzir, finalmente, pela nova cultura. Bibliotecas e museus se abrem para a perspectiva de novos diálogos sociais, reinventando seu posicionamento e sua função na sociedade conectada. De origem grega, a palavra biblioteca significa depósito de livro, referindo-se a uma caixa ou armário para a guarda de livros. A terminação teca é usada ainda em palavras como midiateca, brinquedoteca, pinacoteca, cinemateca, videoteca, filmoteca, hemeroteca e discoteca, esta última em franco desuso, mas com o mesmo sentido de lugar de guarda. Os museus, lugares voltados para a guarda de bens naturais e culturais, se vincularam, ao longo de sua história, ao próprio conceito de passado, quando, de fato, sua função é o exercício do diálogo com as culturas, valendo-se da diacronia como princípio.

A revisão funcional desses lugares, a partir da lógica cultural do acesso e compartilhamento, não os faz abandonar os termos que os nominam, uma vez que a língua permite uma reordenação semântica, atualizando sentidos em função de seu uso. Por outro lado, algumas variações podem acusar essa mudança lógica e sua composição, como podemos notar em termos como biblioteca, biblioteca digital, midiateca e multiteca.

Enquanto o termo biblioteca faz referência a um espaço tradicional, que reúne livros impressos, visivelmente alinhado com seus acervos (posse) e preservação (guarda), as bibliotecas digitais migram seus acervos, colecionando bits que virtualmente se atualizam como livros e afins. A midiateca é fenômeno mais recente, normalmente um espaço da biblioteca que se dedica a mídias não impressas, como vídeos e áudios, em formatos que mudam com o tempo: de fitas cassete, microfilmes e VHS para CDs, DVDs e, mais recentemente, para e-books, podcasts e filmes armazenados em servidores off-line ou on-line.

Na cultura do acesso e compartilhamento, a multiteca ganha relevo ao se colocar como um ponto de compartilhamento de informações de múltiplos formatos, como livros, revistas, jornais, filmes, músicas, vídeos e toda a sorte de informações, sempre digitais e em rede, sem a necessidade de posse ou mesmo guarda. Os servidores que guardam essas informações não necessariamente pertencem à multiteca, que pode aproveitar a existência open access de várias informações já disponíveis e oferecer links diretos para essas fontes, em um exercício de curadoria informacional que provê acesso e compartilhamento. As multitecas podem ou não ter um espaço físico, dispondo, quando há, de dispositivos para acesso ao acervo oferecido, mas essencialmente seu habitat é a rede, e sua atuação se estabelece na seleção e manutenção de informações, não de objetos.

A dinamicidade digital repercute, na cultura, seu elo mais forte: a vinculação humana. As mudanças que provocamos em museus e bibliotecas, para além da inserção de aparatos tecnológicos e a digitalização de acervos, indicam uma lógica muito maior, ligada ao modo como contemporaneamente pensamos e construímos o conhecimento: a lógica do acesso e do compartilhamento.

Leia a coluna publicada.

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