quadrilha social

Quadrilha social

Tema: Quadrilha social.
Veículo: Diário da Manhã
Número: 10.743
Página: 17
Caderno: Opinião Pública
Data: 13/03/2017

Quadrilha social

 

João curtia Teresa no Facebook que seguia Raimundo no Instagram que compartilhava os posts de Maria no Twitter que visualizava as imagens do Joaquim no Pinterest que assinava o canal da YouTuber Lili, que não seguia, curtia, compartilhava nem visualizava ninguém, só tinha olhos para ela mesma. João foi para os Estados Unidos trabalhar com mídia social, Teresa para o convento, mas não conseguiu deixar o WhatsApp; Raimundo morreu de desastre de carro enquanto tentava responder uma mensagem pelo Telegram , Maria faz videoconferência por Skype com a tia, Joaquim suicidou-se quando descobriu que suas contas do Tumblr, Vimeo, Snapchat, Badoo e Tinder foram raqueadas e Lili perdeu seguidores quando vendeu espaço em seu canal para fazer propaganda do  J. Pinto Fernandes, que não tinha entrado na história, mas queria visibilidade depois de ter compartilhado notícias falsas e perdido espaço nas mídias sociais.

Curtir, seguir, compartilhar e visualizar podem parecer, hoje, mais importantes que João, Teresa, Raimundo, Maria, Joaquim ou Lili, embora, de fato, os substantivos acionem os verbos. O protagonismo das redes e mídias sociais continua sendo das pessoas, que escolhem os meios, as mensagens e as abordagens para se mostrarem, posicionarem, defenderem e expressarem sua forma de ver e entender o mundo. As ações expressas pelos verbos não se desvinculam de seus autores e, cada vez mais, será preciso lembrar que postagens nas redes e mídias sociais equivalem à praça pública, em apresentação contínua. Fechar a porta do quarto e abrir as janelas do mundo implica em mostrar ao mundo nosso modo de pensar e agir. Compartilhar notícias falsas, por ingenuidade, ignorância ou má fé, significa espalhar que o autor do compartilhamento é ingênuo, ignorante ou malfeitor.

A construção de relacionamento social on-line requer cuidados, como aqueles que temos ao nos tornarmos amigos de fato de determinadas pessoas. As mensagens que compartilhamos igualmente devem ser averiguadas, para que nossa quadrilha on-line não seja criminosa, mas que persevere a partir da ética, da informação, da comunicação e do respeito, bases da sociabilidade e civilidade, mesmo on-line.

O mundo se preocupa com a propagação de notícias falsas nas redes sociais, criadas por malfeitores e compartilhadas por internautas incautos ou igualmente perniciosos, sedentos pela novidade do dia e por curtidas a qualquer preço. Mas o preço pode ser a vida de alguém, como ocorreu com Fabiane Maria de Jesus, casada, 33 anos e mãe de duas meninas, espancada publicamente na cidade de Guarujá, São Paulo, no dia 3 de maio de 2014, dois dias antes de morrer vitimada pelas agressões sofridas. A morte nem sempre é o resultado dessas quadrilhas que compartilham a mentira. A desinformação começa a se tornar crônica, colocando a sociedade em uma crise aguda.

A quadrilha do poeta, tão viçosa e inventiva, encontra no black mirror um correlato insosso e perigoso. Seja no LinkedIn ou Foursquare, ou qualquer mídia ou rede social, as mensagens que espalhamos, compartilhamos, curtimos ou apenas visualizamos não são ingênuas. Também nós não podemos ser.

E se este artigo faz menção à Drummond, que mesmo gauche na vida não usou o PayPal. Semana passada eu me referia aos versos de Mario Quintana, equivocadamente atribuídos ao não menor Manuel Bandeira. Ficam o registro e a correção, bem impressos em papel, e replicados nas redes, visando a uma boa e correta informação.

 

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