Coluna 26-03 - Nem sempre insípida, inodora e incolor

Nem sempre insípida, inodora e incolor

Tema: Nem sempre insípida, inodora e incolor

Veículo: Diário da Manhã

Número: 11.117

Página: 19

Caderno: Opinião Pública

Data: 26/03/2018

A última semana deveria ter sido dominada por um tema de interesse mundial e relevância inquestionável: a água. Ao longo da semana foi realizado, em Brasília, o Fórum Mundial da Água e no dia 22 de março foi comemorado o Dia Mundial da Água. O bem precioso é apontado como um dos itens de maior valorização em um futuro breve e algumas cidades experimentam o futuro desde já: Brasília e São Paulo tiveram racionamento de água em 2017. Goiânia e região metropolitana, a despeito de não terem oficializado o racionamento, mantiveram seus cidadãos sem água por longos períodos do dia, por longos dias.

Com o fim do verão e o início do período de estiagem, voltamos a nos preocupar com o nível de nossos reservatórios, com o desperdício de água e com nossa baixa competência em tratar a água descartada. Enquanto Israel se vangloria da tecnologia de dessalinização da água do mar e entrega água potável para todos os seus habitantes, o Brasil, que não é um deserto, imputa aos seus cidadãos um racionamento, colocando em xeque não apenas sua competência em relação aos recursos hídricos, mas à própria consciência da importância da água. O índice pluviométrico nacional, as bacias hidrográficas e o aquífero Guarani produzem a ilusão de que teremos água por longos anos, sem a necessidade de preocupação. Já está provado que não é bem assim.

A morte de nossos rios, antes doces, o descaso com o esgoto, cujos índices de tratamento são desalentadores, a baixa utilização de água de reuso e o baixo aproveitamento das precipitações pluviométricas apenas agravam um fato preocupante: nossa cultura de desperdício de água e a incomum despreocupação com esse bem. A eliminação das matas ciliares, como é sabido, faz secar nossas nascentes e cria ravinas em nossos rios, maiores responsáveis por seu assoreamento. Junte-se a esse quadro o despejo de esgoto com baixo ou nenhum tratamento em nossos rios e temos os ingredientes para tornar água inapropriada para uso humano, seja pela baixa qualidade, que requer tratamentos químicos mais intensos, seja pela quantidade de água, cada vez menor.

Nas casas, o uso descomedido de água para os diversos fins e o descarte inapropriado de óleos e lixo não orgânico sentenciam o lençol freático, do mesmo modo que no campo, com o uso de agrotóxicos. Esse comprometimento reduz ainda mais o baixo índice de água potável do planeta, estimado em 0,007% da água existente (quase 98% da água do planeta estão nos oceanos, portanto não potável, e pouco mais de 2% da água doce são inacessíveis, por estarem em seu estado sólido, formando as geleiras polares).

O quadro se torna dramático quando não se verifica a existência de projetos educacionais e sociais sérios para reverter a situação. As ações públicas apontam somente em duas direções: aumento de tarifa - Goiás é o estado brasileiro com maior tarifação sobre a água - e o racionamento. Nota-se que nenhuma delas, infelizmente, conseguirá solucionar o problema, mas tão somente reduzir o consumo, o que, por si, não melhora em nada o problema.

Talvez em alguns poucos anos, quando a situação estiver definitivamente impraticável, tenhamos ações inteligentes de políticas públicas  e educação social, com o propósito de eliminar as causas do problema, e não seus efeitos.

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